quinta-feira, novembro 30, 2006

Working Hard

Tenho trabalhado demais. Corrido atrás do rabo feito cachorro louco. Acabo sentindo falta de vir aqui escrever, por para fora as coisas que me chamam a atenção. Sinto falta desse exercício diário, o de dirijr o pensamento com alguma antecedência ao objeto de meu post cotidiano, organizando as idéias, planejando o texto. Sabendo que terei, com certeza, um momento de paz em que o fruto da observação será colocado em palavras. Arranjado segundo critérios particulares nesse blog, submetido à minha razão, emoção, capacidade mais ou menos eficiente de traduzir o que penso. Sem essa atividade à qual me apeguei, e que a correria louca corporativa impossibilita, sinto-me inquieto e infeliz. Falta-me o prazer de encontrar, ou pensar que encontrei, a melhor forma de dizer.

terça-feira, novembro 28, 2006

Ungodly

Somos de fato uma nação infeliz. Quando parece que alguma coisa está decente, nos conformes, andando com se deve, claro que por acaso pois nada é planejado, alguém percebe e resolve mexer para piorar.
O Ministério da Educação fará, no início do próximo mês, um evento para discutir temas ligados à diversidade e à inclusão educacional. Até aí tudo bem, ponto para eles. Acontece que aproveitarão para debater a volta, de forma facultativa, do ensino de religião em escolas da rede pública. Está previsto na Constituição e na LBD (Lei de Diretrizes e Bases da Educação). Bacana, não é mesmo?
No Rio de Janeiro, desde o final de março, metade dos alunos da rede pública, graças à Rosinha (que não é a Minha Canoa), estão às voltas com o criacionismo. Aprendem que o homem foi criado do barro e a mulher da costela de Adão, 145 anos depois de Charles Darwin publicar "A Origem das Espécies".
Desde que eu era pequenininho, muito tempo faz, essa coisa absurda de aula de catecismo nas escolas tinha sido abandonada. Até por não fazer sentido. Além do Estado dever se abster de palpitar nessa seara, somos um povo com múltiplas crenças. Ensinaríamos qual religião nas classes?
Parece que os intelectuais do governo, responsáveis pela educação do país, não perceberam que o assunto é sempre foco de tensão no mundo inteiro. Morre-se em muitos lugares por divergência de credos. Seria o fim começarmos essas disputas em nossos colégios. Tínhamos, fortuitamente, de forma natural e mansa, chegado ao estado atual. Religião se aprendia em casa, com os pais, cada um a sua e na sua. Depois o fulano podia virar carola, trocar de crença, desacreditar, pregar em qualquer freguesia. Liberdade de culto sempre foi uma bênção em plagas brasileiras. Pelo visto os pensadores do modelo futuro não são macacos velhos, estão loucos para por a mão em cumbuca.

segunda-feira, novembro 27, 2006

Day-dreaming

Sonhar é melhor que viver. Muitas vezes. Fugir da realidade pode ser um recurso salutar, trazer um pouco de tempero e alegria para a rotina. Imaginar que seríamos assim, se não fôssemos assado, é capaz de fazer a diferença entre viver bem ou mal.
Leio, com muito interesse, recente declaração de Agnaldo Silva em entrevista. Nela afirma serem os autores de novelas raça em extinção. A maior parte deles já tem idade, a renovação que se dá é pequena, a tendência é de que acabem.
Difícil para mim não invejar quem pode viver apenas do que escreve. E com muito conforto, ao que me consta. Essa fantasia que alimento, cada vez mais presente, é reforçada quando ouço afirmações como a do ilustre autor. Imagino-me, imediatamente, inventando capítulos para a televisão.
Rcentemente, por dever de um compromisso assumido, tive que passar um dia inteiro escrevendo. Poucas vezes senti-me tão bem e realizado ao final de uma jornada. Não vi o tempo passar, distraí-me, senti que era útil, considerei importante o que fazia. Tudo muito diferente de como me encontro normalmente após oito horas dedicadas à empresa onde trabalho.
É assim que sonho acordado. No futuro, por algum azar da sorte, viverei somente das idéias que ponho no computador. Parceiros: o Word e eu.

sexta-feira, novembro 24, 2006

What A Pity!

Leio sobre a morte do último panda branco e marrom do mundo. A notícia, talvez pela simpatia do bicho exibido, me deixa triste. É estranho testemunhar a extinção de um animal. Saber que foi posto um ponto final naquela existência. Ter consciência de que virarão artigos de museu, ao lado de esqueletos desenterrados.
A diferença é que não matamos os dinossauros, não colaboramos para que sumissem desse mundo. Ao ver o bonito urso sinto-me responsável, envergonhado por minha condição humana. Pesa-me com certa constância saber que somos vorazes destruidores da natureza. Exercemos, sistematicamente, esse poder malévolo. Animais, meio ambiente, tudo. Não ficará pedra sobre pedra.

quinta-feira, novembro 23, 2006

Wondering Soul

Não acredito em alma penada. Melhor, prefiro não acreditar, esforço-me para isso. Tenho uma relação de medo com as coisas que não entendo. Tudo o que é relativo ao espírito me assusta, inclusive as religiões, que exercem em mim espécie de fascínio. Temor reverencial. Certamente, antes de mais nada, por absoluta incapacidade de lidar com a morte, sempre muito além de minha compreenção e aceitação.
Volta e meia ouço conversas, leio reportagens, assisto a filmes que tratam da existência de fantasmas como fatos corriqueiros. A intercomunicação entre dimensões diversas acontece naturalmente, falecidos e viventes do nosso mundo trocando experiências tranqüilamente. Quase sempre, infelizmente, sou atraído de forma inapelável pelo argumento. Depois, com os raros cabelos que me restam em pé, vago pela noite insone, sem conseguir conciliar o sono.
E como tento fugir do tema, passando sempre ao largo, de forma consciente, dos pequenos indícios que o cotidiano oferece, tenho pouco a contar. Geralmente não reparo em indícios evidentes para a maioria. Vultos, ruídos, ventos gelados, coincidências, encontram respaldo na razão, consigo explicar.
Mas para toda regra há excessão. Aconteceu logo após o passamento de meu pai. Estava escrevendo e embatuquei com o uso de uma palavra. Caberia naquele contexto? Perdi a paciência e reclamei, em voz baixa, com o velho:
- Você bem que poderia me ajudar. Sempre escreveu melhor do que eu, está ocioso, sem fazer nada, o que custava entrar na minha cabeça e me ensinar?
Levantei e fui ao Aurélio. Naquela época ainda não havia dicionário online, capaz de agilizar a aborrecida pesquisa. Folheei o pesado tijolo, insatisfeito com a minha própria ignorância, louco para terminar logo com aquela inana. Achei o verbete e li o exemplo dado. Se estivéssemos no cinema a música agora estaria bem alta e seria dado um close na página. As letras dançaram sob os meus olhos. Quando percebi estava arrepiado da cabeça aos pés. Um susto enorme. Larguei o livro e saí correndo do escritório. Adivinhem quem tinha escrito o texto? Sim, meu pai.

quarta-feira, novembro 22, 2006

Free Hugs

Já recebi o filminho pela Internet, já vi pela televisão. Um rapaz carregando uma placa onde se lê: Abraços Grátis, posta-se em uma rua de grande movimento. O fundo musical tem letra bonita, o todo é comovente. De início nos choca a solidão do moço. Oferece-se com sorriso tímido, magro, frágil, cabeludo, movimentando-se e olhando para todos que passam. Há que se enternecer com a figura. Os olhares que lhe dirigem são curiosos, às vezes até debochados. Afastam-se balançando a cabeça, divertidos.
Então um senhora muito pequena, vestida pobremente, se aproxima um pouco encabulada, relutante. Dirige-se ao jovem e abre os braços. Estreitam-se carinhosamente. Embora não se conheçam há muita emoção no jesto, parecem velhos amigos. O primeiro encontro catalisa os próximos. De repente o homem não está mais só. Pessoas param para receber o brinde que é de graça. Passamos a assistir a uma exuberância de estreitamentos das mais variadas matizes. Gente que nunca se viu apertada em braços estranhos, aconchegada. Gostando do próximo. É como se tivéssemos diante dos olhos uma performance psicodélica dos anos sessenta.
A cena funciona como laboratório. Estamos mais acostumados a ver violência explodindo. Os linchamentos, outra manifestação coletiva, iniciam-se também por imitação, só que do ato espúrio. Ainda não tinha testemunhado o povo ampliado assim por um sentimento bom, preocupado em receber e dar amor gratuitamente. Nem sempre ele é assim incondicional. Foi bonito de ver essa festa de paz.

sexta-feira, novembro 17, 2006

With Body And Soul

Não sou nenhum Michael Jackson mas gosto de crianças. Comove-me a forma como são capazes de entrar de corpo e alma no universo ao redor. Com elas não tem meio termo, ainda não aprenderam a contemporizar. A ingenuidade aparente das opiniões que emitem nos revela um mundo sem barreiras, gosto independente. Os pequenos falam sem bloquear o pensamento. Dizem de forma simples o que sentem, sem medo, ou maiores preocupações. Falam a verdade.
Estou escrevendo uma história infantil em um site especializado, capítulos quinzenais. As facilidades de comunicação vigentes permitem que possa receber sugestões dos pequenos leitores. Não estaria mentindo se dissesse escritores mirins. E como são sinceros! Esculhambam-me freqüentemente. Se o conto segue um rumo que não aprovam dizem logo, sem rodeios, que não estão ali para aturar chatices. Uma pirralha de sete anos, de Arapiraca, Alagoas, pediu que eu colocasse príncipes e princesas, onde já se viu esquecer deles? Um garoto de dez, morando atualmente no Japão, falou sobre as brincadeiras de lá, diferentes das nossas, seria legal incluí-las. O romantismo das meninas é evidente. A maioria quer que eu arranje uma namorada para a minha personagem. Criticam, elogiam, entusiasmam-se, fazem do meu trabalho uma tarefa das mais prazerosas. É sempre bom perceber o gosto pela leitura se desenvolvendo.
Outra coisa, os brasileirinhos estão preocupados com o futuro. Ecologia é matéria de estudo e de observação diária. Meti-me a falar sobre um rio morto e agora vou ter que ressuscitá-lo.
- Você não é o dono dessa história? Então tem a força.

quarta-feira, novembro 15, 2006

It Grates On My Nerves

Parecem que descobriram o tema. Até a televisão percebeu que o fato de as pessoas se irritarem facilmente, pode melhorar seus índices de audiência. Não é à toa que a inteligente Fernanda Young está comandando um programa sobre o tema na GNT. De início, quando vi as chamadas, achei que não daria certo, acabariam saindo de cena por falta de interesse dos telespectadores. Errei completamente em minha previsão. É divertido nos identificarmos com o que é exibido. Quem de nós não tem suas manias, como não se aborrecer com coisas muitas vezes ridículas? No fim, ou por sermos iguais, ou por nos acharmos completamente diferentes, acabamos dando risada.
Veja o caso dos passarinhos de manhã cedo, por exemplo. Eles não se mancam. Com a maior falta de cerimônia começam a cantar antes mesmo do dia clarear. Há pouco tempo, quando mudaram o fuso, achei que teria mais uma hora de paz. Que nada! Os danadinhos devem ter relógio, também adiantaram em uma hora o início do suplício matinal. Às vezes sinto que as penas do meu travesseiro respondem a algum tipo de chamado atávico, é como se existissem sabiás, pintassilgos, rolinhas, bem-te-vis, um exército de bicudos sob minha cabeça, vivos, comunicando-se, infernizando meu amanhecer.
E muitas outras coisas. Existe alguma coisa pior do que gente falando alto no celular? Alguns não escolhem hora ou lugar. Dirigindo, pedalando na academia, andando no parque, na igreja, durante a missa, interrompendo a importante conversa com Deus. Outro dia, no ônibus, voltando para casa, sentado ao lado de uma fulana, acompanhei do início ao fim intrincada discussão conjugal. Tive ímpetos de interferir e sugerir a separação do casal, o cara era um canalha.
Tantos são os detalhes, não tão pequenos, capazes de interferir no meu humor, que poderia começar um romance à respeito, teria muito o que escrever.
Natal. Não me falem dessa maldita festa, para mim desgraça coletiva. Trânsito congestionado, pedintes caprichando na expressão infeliz, dificuldade de se estacionar, calor, presentes, shopping centers, Papai Noel, a véspera propriamente dita (a insuportável noite do dia 24) , crianças gritando e correndo para todos os lados, parentes chatos que somos obrigados a ver uma vez por ano, o cunhado idiota fantasiado de bom velhinho, amigo secreto (nada pior!), jantar pesado, inadeqüado e tarde da noite.
E muitas outras coisa mereceriam ser lembradas: música axé, pagode, gente que fala demais, falta de educação, falta de energia elétrica, café frio, filme ruim, gente fumando, gente que fala tocando em você, gente que cospe falando, talk show americano, ausência de bom gosto, ter que esperar, elevador cheio, demonstração de racismo, arrogância, quem fala sem olhar para você, falta de atenção, desrespeito, violência, crueldade, plano de saúde, ter que experimentar roupa, gente mascando chiclete, ignorância, jogo de golfe, chuva na hora do rush, adulto xupando pirulito, criança grande com chupeta, bêbado, dedo futucando o nariz, cachorro latindo sem parar, tudo isso e mais, escolhidos assim, aleatoriamente.
Viver irrita? Não, mas quase...

segunda-feira, novembro 13, 2006

Taxi!

Ela é rica, muito rica. Tem personalidade forte, emite opiniões e as defende com ardor. Nasceu para discutir. Há algum tempo desistiu de andar de carro. Vendeu a Mitsubishi:
- Basta uma pirua lá em casa!
Passou a andar de taxi. Como tudo o que faz considera bem feito, por princípio, não houve arrependimento. Descobriu que podia ser livre. Sai a hora que quer sem se preocupar com o estacionamento, pode tomar seus pilequinhos pois não vai dirigir:
- Minha vida ficou mais simples!
Quando precisa chama um carro pelo celular ou, como faz geralmente durante o dia, acena para o primeiro que vai passando. E pode se exaltar à vontade:
- Brigar com taxista virou um de meus prazeres.
Outro dia tomou um na Oscar Freire. Sentou-se, acomodando as compras, e pediu que a levasse na 9 de julho. O motorista pediu que lhe ensinasse o caminho:
- Como? Pare que eu vou descer. Se você não conhece rua tão famosa é amador, não serve para mim.
Diz que não precisa mais de analista. Resolve seus problemas armando barraco indo da loja para o cabelereiro, da academia para casa, do cinema para a festa. Se o infeliz que dirige o taxi fuma, pede para apagar o cigarro, se corre manda ir de vagar, se não tem ar-condicionado, reclama que está calor, e se tem pede para desligar. E assim desopila o fígado. Quando o assunto é política, espera o coitado falar primeiro para poder ser contra depois.
E é distraída. Por não se preocupar com o mundo está sempre longe, pensando no que lhe interessa, sonhando com as maravilhas que pode ter, sem dar atenção ao que acontece em volta. Outro dia, saindo da Daslu carregada de sacolas, caminhando em direção ao taxi que deixara esperando, foi abordada por um mendigo. Com ar miserável o pobre homem falou que estava há quatro dias sem comer. Ela olhou para ele com ar incrédulo e exclamou:
- Meu Deus, como eu gostaria de ter sua força de vontade!

sexta-feira, novembro 10, 2006

Whales

Sempre que leio notícias sobre baleias me interesso. É curiosidade antiga, vinda da adolescência, tempo em que me deliciei com as páginas de Moby Dick, de Herman Melville. Poucos livros me despertaram fascínio igual. Lembro que cheguei a sonhar com o cachalote branco enfurecido, saltando em frente a um barco onde eu navegava, ameaçando afundá-lo. Pesadêlo terrível. A força e tamanho do bicho sempre me assustaram. Até hoje, quando vejo o mar em dias cinzentos e misteriosos, tenho a sensação de que o velho e descomunal mamífero de minha juventude vai saltar, todo espetado de arpões, do meio das ondas.
Mas o tempo, de certa maneira, muda nosso interior. A imagem que ainda me resta é pura fantasia, momentânea, se afasta da realidade. Somos agora um mundo de capitães Ahab bem sucedidos. O homem, com relativa facilidade, apressa-se em extingüir o belo animal, apesar das campanhas de recuperação que permitiram que um reduzido número nadasse por aí. Não existe, porém, futuro para os filhos de Moby Dick. Além de nossa usual capacidade destruidora, enfrentam outros inimigos. De repente, sozinhos, encalham e morrem.
As manchetes de hoje, vindas da Nova Zelândia, mostram uma espécie de suicídio coletivo que me encheu de remorso e pena. Cerca de oitenta baleias enfileiradas, encalhadas em uma praia.
Houve uma inversão conceitual na maneira como passei a olhar o tamanho. O grande, que para mim já foi forte, tornou-se fraco. Tive a oportunidade de ver outro dia, andando na Av. Paulista, o gigante chinês Xi Shun, carregando os seus 2,36 metros, 117 quilos, sapatos tamanho 57. Apoiava-se bambo em uma bengala, andava vagarosamente com cuidado extremo, como se estivesse prestes a desmoronar. Nada mais assustadoramente frágil. Como são as baleias agora.

quarta-feira, novembro 08, 2006

Turn It On Again

Outro dia vi na tv uma reportagem interessante. Falava de um grupo de senhores que estudara junto em uma escola. Na época tocavam em festinhas, tinham uma banda. Depois cresceram, cada um tomou seu rumo, perderam o contato. A maturidade fez com que as lembranças voltassem muito fortes. Mais ou menos ao mesmo tempo sentiram necessidade de se reencontrar. Como sempre se faz nos dias de hoje, pediram socorro à Internet. Cada um pesquisando em seu computador, vivendo em bairros e cidades diferentes, acabaram se descobrindo. O programa captava bem a emoção do momento. Sentados em volta de uma mesa, gordos, calvos mas ainda jovens, cantavam e tocavam, com afinação comovente e indisfarçável alegria, rejuvenescidos, uma canção dos Beatles.
Outros três senhores, cinqüentões muito mais famosos, acabam de declarar que iniciarão uma turnê. O tecladista Tony Banks, o baixista Mike Rutherford e o cantor e bateirista Phil Collins, farão uma série de apresentações na Europa. Sim, o Genesis está de volta. Com a mesma vontade e motivação do grupo anterior menos conhecido. Para eles uma reunião de antigos companheiros de colégio, no caso a Chaterhouse School. Explicaram que foi muito fácil ensaiar, e que as canções simplesmente tinham voltado às suas cabeças, pois faziam parte de suas vidas.
Concordo. Existem diversas músicas que pertencem à minha história. O Genesis fez algumas delas. Acompanhou minha evolução (ou seria involução?). Até o começo dos anos oitenta, o rock progressivo que faziam, com estruturas musicais complexas e letras rebeldes, adeqüava-se perfeitamente ao jovem que eu era. Depois, caminhando em direção ao pop, romanceando bastante melodias e palavras, possibilitaram que, mais velho, continuasse admirando o conjunto.
Turn It On Again, além de ser o título de um de seus hits, é o nome que escolheram para os shows que farão. Espero que Phil Collins, que subitamente perdeu a audição do ouvido esquerdo em 2000, e que tem recomendação médica de não mais tocar ao vivo, não sofra maiores conseqüências. E que se esbalde na bateria. Ninguém, para mim, tem levada tão forte e característica.
E para anteciparmos um pouco a festa, deixo parte de letra da primeira fase do grupo, muito adeqüada ao momento do blogueiro que vos escreve.
That's Me
Every morning when the people are out
And I'm free move around on my own
I look into the sun and I see a reflection
Of a sad and lonely shrivelled man
That's me, that's me
And I know it's how I'm always gonna be

terça-feira, novembro 07, 2006

Cecília Meireles

Ainda não disse que gosto de poesia. Gosto muito. Novembro é para mim, e deveria ser para mais gente, um mês dedicado a Cecília Meireles. Ela nasceu no dia 07, hoje, em 1901, e morreu depois de amanhã, no dia 09, em 1964. Considero a poesia dela linda, delicada, de uma força extraordinária, e frágil ao mesmo tempo. Ela escreveu uma vez: a vida só é possível reinventada. Os poetas não cansam de nos ensinar. A poesia, sobrevivendo, nos completa.
Cecília Meireles
Depois do sol...

Fez-se noite com tal mistério,
Tão sem rumor, tão devagar,
Que o crepúsculo é como um luar
Iluminando um cemitério . . .

Tudo imóvel . . . Serenidades . . .
Que tristeza, nos sonhos meus!
E quanto choro e quanto adeus
Neste mar de infelicidades!

Oh! Paisagens minhas de antanho . . .
Velhas, velhas . . . Nem vivem mais . . .
— As nuvens passam desiguais,
Com sonolência de rebanho . . .

Seres e coisas vão-se embora . . .
E, na auréola triste do luar,
Anda a lua, tão devagar,
Que parece Nossa Senhora
Pelos silêncios a sonhar . . .

segunda-feira, novembro 06, 2006

Capital Punishment

Quem me visita, lê o que escrevo, já deve ter percebido que não gosto de ditadores. Considero Saddam Hussein um dos piores representantes da espécie. Matou, torturou, espalhou sofrimento por onde passou. Interessante vê-lo brandindo o Alcorão, exaltado, praguejando contra os que o condenaram. É sempre difícil, quase impossível, para quem foi Deus por tanto tempo, perder a arrogância e a impáfia. Não senti, porém, prazer em ver a cena. Sou muito diferente do ex-dirigente iraquiano.
Incomoda-me ver gente atrás das grades, tremendo. Não gosto de ver o medo nos olhos das pessoas. Sou incapaz de assistir a uma cena de tortura, dessas que os filmes exibem freqüentemente, sem ter vontade de levantar-me e ir embora. Tenho pela violência desprezo profundo. Como aceitar, então, a pena de morte?
Não vou argumentar dizendo que seria um castigo estúpido. Capaz de criar uma espécie de mártir que Saddam não merece ser. Estaria aceitando a punição caso discutisse a sua conveniência.
Nesse aspecto sou radical. Matar é igualar-se ao assassino. Ninguém tem esse direito. Quando a sociedade, através de suas leis, condena alguém à morte, torna-se um grupo doente, vingativo e criminoso. De certa maneira pior, pois o crime legal que comete, sobre o pretexto de punição exemplar, é analisado, discutido e premeditado.
Gostaria de estar aqui comemorando uma pena justa para o pequeno homenzinho. Que tivesse tido um julgamento honesto, com defensores de fato, sem conivência com exigências estrangeiras. Que ficasse preso o resto de sua indigna vida. A pena capital fez com que tivesse, para meu desgosto, alguma simpatia por ele. Ridículo o juiz não ter permitido que escolhesse o fuzilamento ao invés da forca. Ridículo e cruel. Não há sabedoria na crueldade.

sexta-feira, novembro 03, 2006

Misunderstanding

Hoje recebi mensagem eletrônica de uma prima. Sempre me perguntei como nascem as piadas. Imagina-se que venham do cotidiano. Da observação dele, das coisas engraçadas que acontecem de fato, e depois são repetidas. Nunca tinha, porém, visto comprovada tão claramente essa tese. Os humoristas, com certeza, são pessoas muito atentas ao mundo em que vivem. Retiram, com muita sabedoria, dos fatos corriqueiros o material do seu trabalho. Observem abaixo se não tenho razão:
Querido primo Lord,
Lendo a piada que recebemos, a do mineirinho que transou com a americana, aquela que quando pedia "Once more", ele respondia "Bel'Zonte", me lembrei de um fato acontecido de verdade com um amigo meu. Ele é um excelente arqueólogo, com livros traduzidos no exterior e presença em congressos internacionais, mas é um caipirão, desses legítimos, não de Bel'Zonte, de Goiânia. Na sua primeira experiência vivendo no exterior, foi para Washington com mulher e filha, estudar numa instituição prestigiada. Lá nos encontramos. Ele não falava quase nada de inglês, morria de medo de tudo, andava agarradinho na rua com a mulher e a filha, os três formando uma espécie de bolinho de gente. Um dia, nos contou: "Sabem? Sempre que eu entrava no elevador da escola, achava que a ascensorista, uma negona alta e gorda, tava me dando bola. Ela toda vez me dizia assim: Oi, flor! Até que, vários dias depois, percebi que na verdade ela estava me perguntando: What floor?".

quarta-feira, novembro 01, 2006

All Soul's Day

Fim de férias longuíssimas, quase três mêses fora. Naquela época terminávamos as aulas em novembro e só começávamos o ano letivo em março. No ônibus, refazendo o caminho em sentido oposto, lembro da sensação gostosa que sentia. Saudade grande. Queria andar pela rua arborizada, dormir na cama em que estava acostumado, rever os amigos, botar minha irmã pequena no colo, conversar com meus pais. A ansiedade que sentia era companheira ingrata. Sabia, porém, que por mais tempo que demorasse na estrada, por mais calor que sentisse, em breve chegaria ao meu destino. A impaciência juvenil, em nenhum momento, conseguia ofuscar a felicidade daquela viagem. Era bom voltar para casa.
Meu pai atendeu respondendo aos nossos apelos insistentes. Só de farra esquecêramos os dedos na campainha da porta, prolongando o chamado para nós festivo. Anunciávamos brincalhões nosso retorno. Pulei nos braços dele. O abraço que demos foi tão apertado que senti o acelerar dos dois corações disparados, atropelando-se colados, o meu e o dele. Jamais esqueci aquele reencontro. Com os olhos úmidos o velho declarou a falta que sentiu de mim. Beijou-me com carinho. Pude perceber o quanto eu era importante e querido. A magia daquele momento ainda é capaz de me comover, tantos anos depois. Me dá forças até hoje.
Amanhã, dia de Finados, tentarei não chorar.