quinta-feira, novembro 23, 2006

Wondering Soul

Não acredito em alma penada. Melhor, prefiro não acreditar, esforço-me para isso. Tenho uma relação de medo com as coisas que não entendo. Tudo o que é relativo ao espírito me assusta, inclusive as religiões, que exercem em mim espécie de fascínio. Temor reverencial. Certamente, antes de mais nada, por absoluta incapacidade de lidar com a morte, sempre muito além de minha compreenção e aceitação.
Volta e meia ouço conversas, leio reportagens, assisto a filmes que tratam da existência de fantasmas como fatos corriqueiros. A intercomunicação entre dimensões diversas acontece naturalmente, falecidos e viventes do nosso mundo trocando experiências tranqüilamente. Quase sempre, infelizmente, sou atraído de forma inapelável pelo argumento. Depois, com os raros cabelos que me restam em pé, vago pela noite insone, sem conseguir conciliar o sono.
E como tento fugir do tema, passando sempre ao largo, de forma consciente, dos pequenos indícios que o cotidiano oferece, tenho pouco a contar. Geralmente não reparo em indícios evidentes para a maioria. Vultos, ruídos, ventos gelados, coincidências, encontram respaldo na razão, consigo explicar.
Mas para toda regra há excessão. Aconteceu logo após o passamento de meu pai. Estava escrevendo e embatuquei com o uso de uma palavra. Caberia naquele contexto? Perdi a paciência e reclamei, em voz baixa, com o velho:
- Você bem que poderia me ajudar. Sempre escreveu melhor do que eu, está ocioso, sem fazer nada, o que custava entrar na minha cabeça e me ensinar?
Levantei e fui ao Aurélio. Naquela época ainda não havia dicionário online, capaz de agilizar a aborrecida pesquisa. Folheei o pesado tijolo, insatisfeito com a minha própria ignorância, louco para terminar logo com aquela inana. Achei o verbete e li o exemplo dado. Se estivéssemos no cinema a música agora estaria bem alta e seria dado um close na página. As letras dançaram sob os meus olhos. Quando percebi estava arrepiado da cabeça aos pés. Um susto enorme. Larguei o livro e saí correndo do escritório. Adivinhem quem tinha escrito o texto? Sim, meu pai.

2 comentários:

Anônimo disse...

Amigo Lord,
Não há o que temer! Fantasmas não são fantasmas, e sim, fluidos do amor daqueles que cativamos...

Meu novo endereço do blog (que tb está de cara nova):
http://laynefdsp.zip.net

Lord Broken Pottery disse...

Então eu temo esses fluidos.
Kisses