Vendedor no portão. Limpa as caspas do ombro em um gesto amplo, conserta o nó da gravata, apoia a mala no chão, enxuga o suor da testa com o lenço e toca a campainha.
A menina larga o velocípede no chão do quintal, vem lá de trás correndo, curiosa, ver quem é. Chega arfando, demora para recuperar o fôlego. Ele:
- Sua mãe está?
Ela sorrindo marota, baixando a voz:
- Mamãe tá na terapia.
A menina larga o velocípede no chão do quintal, vem lá de trás correndo, curiosa, ver quem é. Chega arfando, demora para recuperar o fôlego. Ele:
- Sua mãe está?
Ela sorrindo marota, baixando a voz:
- Mamãe tá na terapia.
35 comentários:
Uau! e pensar que sou a primeira a comentar.. eu
Absolutamente especular e spetacular.
Um recorte da vida num olhar e numa escuta maravilhosa.
Estou boba! De feliz é claro.
Sabia que há cerca de 10 anos eu estudo essas peças curtas, Lord? Essas narrativas breves?
Muitos parabéns!
Você é um mestre e para poucos se pode dizer isso. Não que eu me ache autoridade para dizê-lo
Quem me dera!
Mas sei que alguém com mais força crítica irá dizer isso. Cabe a mim apenas a profecia: dizer primeiro!
Absoluta maravilha!
Maria Elisa Guimaraes
(Meg)
Meg já disse da melhor forma o que o seu texto representa em matéria de Narrativas Breves, em que ela é 'expert'.
Roupagem sucinta, muita força e expressão.
Impressionante!
Lord, em duas ou tres linhas já dá para imaginar toda a história. O mascate, suponho de origem sirio libanesa que teimamos em chamar de turco (para desespero do brimo, coitado, a mala de couro, surrada pelo uso. O terno possivelmente branco, para espantar o calor. E a menina de velocípede, bem anos sessenta. Agora uma pergunta teima em atormentar a cachola: terapia, já àquela época?
Bom, a história é tua, nem precisa explicar nada.
Muito boa mesmo,
Grande abraço, mano
Valter, tivemos interpretações irmãs! Eu tb vi uma menininha anos 60...com a mãe na terapia?
Lord Caco, adorei, como sempre.
Anos sessenta é só o vendedor. a graça está na contraposição. Só espero que ele esteja vendendo um vibrador e não uma Enciclopédia Barsa. ahaha
Sensacional, Lord
Lord, outro dos seus textos excelentes. Fico abismado com esse dom que possui de construir um universo tão completo em poucas frases. Dá para sentir o impacto só de ler os comentários, alguns deles maior do que o texto. Parabéns, meu amigo. Bravo!
Para não cometer o exagero a que se referiu o Mário, serei absolutamente breve: fantástico.
Mesmo porque a nossa querida Meg disse primeiro, e tudo.
Forte abraço e bom fim de semana!
Meg,
Você, claro, é minha amiga. Olha-me sempre com olhos de muita consideração. Quanto à crítica... Ela existe?
Grande beijo
Magaly,
Obrigado. É minha proposta atual de escrita. Textos breves, com poucas palavras. Vou tentar dizer mais, com menos. É como tenho me sentido bem escrevendo.
Beijão
Valter,
Obacana da literatura é que nos leva para onde queremos ir. Por isso prefiro ler teatro do que vê-lo representado. Fico sempre com a sensação de estarem tripudiando da minha imaginação. Duvido que consigam encenar "As Três Irmãs" da maneira que imagino. A historinha em questão aconteceu nos anos oitenta, com uma sobrinha, filha do Rogério. Lembro apenas da última frase. O resto inventei.
Grande abraço
Vivien,
A resposta ao Valter vale pra você. De qualquer maneira, nos anos sessenta Freud já tinha feito o que havia para ser feito.
Beijo carinhoso
Guga,
Foi essa a minha proposta. O contraste entra a juventude da menina, muito pequena, e a resposta, adulta.
Grande abraço
Mário, querido amigo,
É o que tenho tentado ultimamente. Dizer muito com pouco. É um bom exercício. Tem sido prazeroso.
Grande abraço
Eduardo,
Sua opinião é mito importante para mim. Ótimo fim de semana para você também.
Abração
Pelo menos nisso o passarinho não atrapalhou,se é que não ajudou.Não se zangue comigo;seu conto é uma beleza,mas ainda estou chocada com post anterior.
Lord,oh milord!
De minha parte fica um pouco difícil responder;-)))
Já ganhei dinheiro fazendo crítica e espero não ser processada;-)
Agora, entendo que certos críticos é que não deveriam existir: estes a quem me refiro, como sempre repito, escolhem um caminho que não me seduz: o de acharem que são mais levados em consideração se *baixarem o pau*; *descerem o sarrafo* e outras coisas do mesmo indigno jaez;-)
Hahahah (estou me escangalhando aqui de rir, Lord Mau , Meg boa).
Mas o caminho que escolhi ainda é o mais difícil, e, porque não dizer , o melhor;-)
(modéstia existe?!!!)
E vejo isso quando leio, por exemplo, o que o Guga falou!
Esse menino, Gugala, olhe... "ticontar"!
E também, alguém de quem jamais duvido: a queridíssima Magaly, que já demonstrou inúmeras vezes, a fina argúcia, a cirúrgica precisão com que traduz sua leitura, coisa que minha prolixidade impede.
Mas, como sou espevitada, repito:
este seu post é um autêntico modelo, exemplar, do que nós, o *VERDADEIROS* críticos (hahah*), chamamos de *Formas Breves* . O exercício mais difícil. O do corte, o da ceifa!
Taí, vou fazer (mais) um post sobre isso.
***
E viva a Vivien que demonstrou lindamente como o leitor *briga interiormente* com o texto, e faz colidir o fato com a ficção.
Viva!!!!!
E queremos Vivina, djá!
Está lançada a campanha pela Vivina blogueira.:-)
Não é Eduardo?
beijos
Meguita.
P.S. E o Lord sabe que sabe das coisas;-)
eu achei tão moderno isso...
Pouco vale MUITO!
Como é difícil alcançar essa simplicidade tão rica. Mas você - É ÓBVIO - consegue.
Impressionante, Lord.
Beijuca
Lord, quando lemos nos transportamos.
Naturalmente que cada um leva a cena, ou a situação para o seu habitat.
O período não importa, a mãe poderia estar em qualquer lugar, até na lavanderia.
Um beijo
caspa, velocípede, vendedor porta a porta... terapia?
legal a mistura de tempos.
" ... mamãe tá na terapia, e eu, que já tive alta, estou louquinha para fazer um sexo rápido com um estranho, topas ?"
Anunciação,
Eu não me zangaria com você. O sabiá ajudou, sim. Com ele, não sei bem qual a razão, acabei ficando com mais vontade de escrever. Talvez devido à insônia.
Abraço
Meg,
Eu fico em two minds quando penso na crítica. Embora considere que a ausência dela seje ruim demais, quase não temos crítica hoje em dia, guardo na lembrança gente como era o Telmo Martino, bem dentro do exemplo que você deu. De qualquer forma, agradeço os elogios. O que mais gostaria de poder fazer atualmente era viver do que escrevo. Quem sabe um dia...
Beijo
Tatiana,
Eu também, bem de acordo com nossos dias.
Beijão
Van,
Concordo. Acho que em matéria de arte, a maior riqueza está na simplicidade.
Beijo
Aninha,
A impressão que eu tenho é que nesse caso a mãe só poderia estar na terapia. Em qualquer outro lugar mudaria o sentido do conto.
Grande beio
Anna,
Não entendi bem o que você quis dizer com mistura de tempo. Tudo o que está no conto aida é muito atual.
Beijo
Pô Peri!
A menina é novinha, anda de velocípede, seria pedofilia.
Grande abraço
meguita, o 'garoto' agradece pelo reconhecimento do ´quase-meio-século' bem 'vivido'.
bj
Guga,
Passei há três anos do meio século. Não foi fácil.
Grande abraço
Hauahuahauahaua... "vi" a cena e não pude controlar o riso.
Claudia,
Na época, quando ouvi a história, também achei engraçado.
Beijo
Lord, cheguei até aqui depois de ler todos os comentários.
o texto, é a sua cara. vc disse em algum lugar, acho que na sandra que queria um retrato seu nos extos para não ser plagiado. cara, não precisa. eu, leitora nova de seus escritos , já aprendi a identificá-lo.
genial, e quero informat, que nos idos de 1959, minha mãre faia terapia no hospital santa Clara , de Bh.claro que era uma terapia completamente diferente da que temos hoje, mas , repetinddo, completamente inovadora para a época. então, se batessem no portão da minha casa , com certeza minha irmã largaria o velocipede e diria...: minha mãe foi pra terapia, e minha irmã está lá com ela...
sou leitora, e adorei!
bjos
Marília,
Obrigado pelas palavras carinhosas. É como já disse, Freud já era bem conhecido em 1960.
Grande beijo
Caro Lord,
Eu sim é que aprendo muito a cada vez que venho aqui...
Perdoe-me pela ausência, ando realmente muito sem tempo, com problemas de conexão em casa, e meio desanimada amigo...
Mas cá estou, vir aqui é sempreum grande prazer...
Uma linda primavera, repleta de flores, como vc merece, boa semana, Beijos, Cris
Bem que falam que é o mal do século,né??
rsss
Estas modernidades
Abração e uma otima semana a vc
Me lembrei dos vendedores de livros que batiam palmas no porão da casa do meu avô, nos meus tempos de criança. Foi de um deles que meu pai comprou os volumes dos Contos de Grimm em tradução sem adaptações para o português. Mãe na terapia, nos anos 60, era mais ou menos como pais separados: raro e ainda tratado com certa estranheza. Bela mini-crônica.
Porão, não: portão. A casa do meu avô não tinha porão.
vendedor ambulante, velocípede, caspa, terapia... dá uma certa tontura temporal.
Lord,
Delícia de surpresa ler uma mini-crônica sua!
Adorei!
Tem um prêmio pra vc no meu blog!
Beijão!
Jayme, sabe que tirando afigura de um brimo, terno branco e falar "enrolado" a figura do vendedor de livros foi aprimeira que me veio à mente também?
Minha mãe comprou-me diversas coleções de livros, na porta. Inclusive uma assinatura do Círculo do Livro foi feita assim. E um trauma de infância: ela nunca me comprou uma Barsa, desejo reprimido.
Abraço forte
)Lord, obrigado pelo espaço)
Lord, sabe que na postagem de hoje, lembrei de você? Acho bem provável que voce esteve por lá há trinta anos.
Abração
Cris,
Fique tranqüila, venha quando puder, não transforme em obrigação o que é para ser prazer.
Grande beijo
Do,
Depois vão dizer que sou "muderno". Boa semana pra você também.
Abraço
Jayme,
Eu tinha um colega na escola que tinha os pais separados. Olhava para ele como se fosse um marciano.
Grande abraço
Anna,
Gostei da colocação: tontura temporal.
Beijo
Alicinha,
Estou indo lá ver.
Beijo
Valter,
Barsa, Britânica, era o tempo das enciclopédias. Ninguém imaginava o que viria a ser a Internet. Estou indo visitá-lo.
Abraço
Lord
Gostei da menina,interada e esperta
Mas não sei porque imaginei um alto portão de ferro trabalhado,um quintal de terra batida, e a menina com um vestidinho branco.
Com um pirulito em uma das mãos, vendo o homem,levantou-se e caminhou até o portão.Gostei da cena,espero que os detalhes que minha imaginação acrescentou,não tenha prejudicado o texto.
Não sei mesmo, porque imaginei desta forma, uma vez que o título é "Mundo Moderno"???
Maria Helena,
O melhor dos textos é o que fica na imaginação. Nunca atrapalha o texto. Bom que você tenha podido ver de maneira diferente. Cada um tem que poder fazer sua própria leitura. Um bom texto provoca diversas interpretações.
Grande beijo
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